Silêncio, burocracia e um relógio que avança sem piedade compõem o pano de fundo de Viver, remake de Akira Kurosawa que chegou ao catálogo da Netflix. No longa, Bill Nighy interpreta um funcionário público britânico que se dá conta da própria finitude após receber um diagnóstico devastador. A partir daí, pequenos gestos ganham força, e a rotina cinzenta de Londres pós-guerra passa a ser questionada.
Dirigido por Oliver Hermanus, o drama de 2022 adapta o clássico japonês Ikiru (1952) para o universo britânico sem perder a essência. A produção recebeu avaliação 9/10 em diversas publicações especializadas, consolidando-se como uma das histórias mais tocantes disponíveis no streaming. No Salada de Cinema, o título já aparece entre as indicações mais buscadas pelos leitores.
Enredo mantém espírito original de Kurosawa
A narrativa segue Mr. Williams, chefe de um pequeno setor da administração municipal que age no piloto automático. Papéis circulam sem chegar a lugar algum, criando uma sensação de paralisia coletiva. Quando o médico confirma que ele tem uma doença terminal, o personagem percebe que o tempo que ignorava, agora, o observa de perto.
O roteiro, assinado por Kazuo Ishiguro, preserva a premissa de Kurosawa: um homem comum que tenta dar novo sentido a seus últimos dias. Em vez de uma revelação espiritual grandiosa, Viver investe em fricções sutis, mostrando como cada tentativa de aproveitar a vida esbarra em hábitos rígidos e convenções sociais.
Bill Nighy traduz a melancolia silenciosa do protagonista
Conhecido pelo carisma em comédias britânicas, Nighy assume aqui um registro contido. Sua postura ereta, a voz baixa e o olhar distante evidenciam um profissional condicionado a seguir regras sem questionar. Essa contenção torna-se ainda mais potente quando o ator decide quebrar o ciclo burocrático para realizar um único projeto significativo.
Em cena, a transição do tradicional chapéu-coco para um fedora deixa claro o conflito interno do personagem. O detalhe de figurino simboliza uma liberdade improvisada, quase cômica, que reforça o aspecto humano da jornada. Sem discursos inflamados, Nighy mostra que coragem também pode ser discreta.
Reconhecimento internacional
A atuação rendeu ao ator indicações a prêmios e elogios da crítica internacional. Observadores destacam como sua performance mantém a sobriedade britânica ao mesmo tempo que expõe fragilidade, contribuindo para que o remake de Akira Kurosawa seja visto não apenas como homenagem, mas como obra autônoma.
Miss Harris simboliza a vitalidade que faltava ao protagonista
Vivida por Aimee Lou Wood, a jovem colega de trabalho surge como um contraste direto à rotina engessada de Williams. Ela ri alto, fala sem rodeios e encara a cidade com curiosidade genuína. O fascínio dele por essa energia não nasce do romance, mas da descoberta de que a vida poderia ser mais espontânea.
Os encontros em cafés e parques oferecem ao protagonista exemplos práticos de leveza. Ao acompanhar a moça em tarefas simples, ele entende que viver não exige gestos épicos, apenas disposição para sentir o presente. Quando Miss Harris troca de emprego, fica claro que repetir a juventude alheia não recuperaria décadas perdidas.
A burocracia como antagonista invisível
Se em muitos dramas o vilão tem rosto, aqui a ameaça é um sistema. Pilhas de formulários, carimbos e comissões intermináveis impedem que a construção de um parque infantil avance. Esse cenário funciona como metáfora de qualquer instituição que engole a iniciativa dos indivíduos.
Imagem: Divulgação
O remake de Akira Kurosawa enfatiza esse conflito ao mostrar uma repartição que se alimenta de protocolos. Questiona-se: quantas vezes projetos simples travam por medo de romper hierarquias? A pergunta ecoa entre espectadores, especialmente aqueles familiarizados com ambientes corporativos.
Detalhes de produção
A equipe de arte recria a Londres de 1953 com luminosa precisão. Locais históricos, trens antigos e vestimentas elegantes reforçam o peso do período pós-guerra, quando a reconstrução do país convivia com hábitos conservadores.
Projeto do parque transforma a trama em reflexão social
Ao perceber que os dias são contados, Williams decide lutar pela área de recreação solicitada por um grupo de mães. A iniciativa exige enfrentar departamentos que ele mesmo ajudou a manter imóveis. Cada visita, telefonema e memorando torna-se ato de rebeldia silenciosa.
Quando o parque finalmente sai do papel, o longa evita grandiosidade. A entrega do espaço ganha tom singelo, reforçando que pequenas vitórias podem mudar a vida de uma comunidade. Nesse ponto, o espectador pode se perguntar: que legados podemos deixar a partir de ações aparentemente modestas?
Produção e recepção crítica
Filmado em 2021 e lançado nos cinemas em janeiro de 2022, Viver conta com trilha sonora de Emilie Levienaise-Farrouch e fotografia de Jamie Ramsay. A distribuição internacional ficou a cargo da Sony Pictures Classics, enquanto a Netflix assumiu o streaming global no segundo semestre de 2023.
Sites especializados atribuíram nota média de 9/10, elogiando fidelidade temática e atualizações culturais. Para muitos críticos, o remake de Akira Kurosawa prova que histórias universais suportam novas leituras sem perder relevância. Assim, o drama encontra lugar de destaque entre lançamentos recentes do serviço.
Serviço
Viver (Living)
Diretor: Oliver Hermanus
Ano: 2022
Gênero: Drama
Disponível na Netflix


