Diego Olivares | 17 de abril de 2017

Martírio

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2017/04/1474724560_033841_1474726225_sumario_normal.jpg”] O cinema, enquanto arte audiovisual, possui um potencial social inigualável. Ao expor a situação dos índios Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul, o documentário “Martírio”, dirigido por Vincent Carelli, Ernesto de Carvalho e Tita, educa, constrange e revolta o espectador diante de tamanha indecência e hostilidade histórica sofrida pelos índios e ignorada por […]

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2017/04/1474724560_033841_1474726225_sumario_normal.jpg”]

O cinema, enquanto arte audiovisual, possui um potencial social inigualável. Ao expor a situação dos índios Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul, o documentário “Martírio”, dirigido por Vincent Carelli, Ernesto de Carvalho e Tita, educa, constrange e revolta o espectador diante de tamanha indecência e hostilidade histórica sofrida pelos índios e ignorada por nós.

Didático no melhor sentido da palavra, o filme constrói, em suas quase três horas de duração, um painel histórico das violências estatais e civis contra os Guarani-Kaiowá. Dos tempos da Guerra do Paraguai, em que o território indígena fora agregado ao Brasil e considerado devoluto pelo Império, até os dias atuais, em que os interesses do agronegócio atropelam as pequenas concentrações de resistência, o que existe é um cenário constante de conflito. A única razão de eu usar a palavra “conflito” é a força e a persistência dos índios que, mesmo isolados, seguem lutando incessantemente, pois trata-se de um verdadeiro genocídio.

Intercalando com o aspecto histórico, que é desenvolvido através de riquíssimas imagens de arquivo, o documentário apresenta o contato dos cineastas com as tradições da tribo. Este é outro aspecto fundamental da relevância de “Martírio”: trata-se de um registro próximo e imortalizado de uma cultura à beira do extermínio.

É nas imagens de arquivo que o longa apresenta o destrato de todos os governos brasileiros com os Guarani-Kaiowá através do tempo. Das inúmeras tentativas de aculturação aos discursos raivosos e repetitivos da bancada ruralista no congresso, fica claro que o interesse econômico vale mais que a vida humana. Mas há também registros de demonstrações civis que evidenciam que o problema não se limita a relações institucionais.

Umas das questões mais contundentes levantadas pelo filme é a relação dicotômica dos ruralistas e dos indígenas com a terra. Se por um lado há um apresso praticamente divino por ela enquanto propriedade privada, do outro há uma noção também sagrada da terra, mas dela enquanto um lugar de memória, sentimental e coletivo.

Tendo como ponto de vista o de Vincent Carelli, diretor e antropólogo indianista que mantém contato com os Guarani-Kaiowá desde o final dos anos oitenta, tendo inclusive nas suas reflexões momentos de grande emoção, o filme tem seu ápice representativo quando há uma mudança total de perspectiva. É através dos olhos de um dos índios, gravando um dos muitos ataques que sofrem, que “Martírio” consegue expor o horror constante da realidade indígena no Brasil.

Ao dar luz e voz a um povo e uma cultura injustiçada e invisível a nós, “Martírio” se torna um dos filmes nacionais mais importantes dos últimos tempos.

Assista ao trailer de ‘Martírio’:

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