Thiago Nolla | 30 de maio de 2017

multitela: Meu DeNiro está vivo (de verdade) em O Mago Das Mentiras

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2017/05/o-mago-das-mentiras-hbo.jpg”] Há muito tempo, sou fā de Robert DeNiro. Ele é um dos interpretes mais completos de Hollywood: compõe personagens cheio de cacoetes e, ainda assim, humanos. Fez isso em Touro Indomável, Taxi Driver e até em Mafia no Divā. Mas há tempos ele estava acomodado, no piloto automático, repetindo o mafioso ora sério, […]

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2017/05/o-mago-das-mentiras-hbo.jpg”]

Há muito tempo, sou fā de Robert DeNiro. Ele é um dos interpretes mais completos de Hollywood: compõe personagens cheio de cacoetes e, ainda assim, humanos. Fez isso em Touro Indomável, Taxi Driver e até em Mafia no Divā. Mas há tempos ele estava acomodado, no piloto automático, repetindo o mafioso ora sério, ora engraçado, como se seu talento estivesse adormecido. Felizmente, não se pode dizer que isso seja verdade em O Mago das Mentiras.

O novo telefilme da HBO conta a história de Bernie Madoff, um dos investidores mais representativos do mercado financeiro, inventor de conceitos importantes na área. Em 2010, ele foi preso e condenado por estruturar o maior esquema Ponzi que o mundo já viu: basicamente, pegava dinheiro emprestado de diversas pessoas, dizia que investia, mas pagava dividendos à outros investidores.

O filme funciona com uma estrutura essencialmente documental, delineada por uma direção sóbria e distante, mas eficiente – é como se assistíssemos a episódios concentrados de Making a Murderer. Não se sabe se alguém além de Bernie compartilhava de seus segredos ao longo de mais de 20 anos de falcatruas e esse é o recurso mais interessante do filme.

No entanto, o diretor emprega alguns recursos sensacionalistas, como a encenação narrada do drama das vítimas – algumas se mataram ao saber que perderam tudo. O problema é o tom: esses trechos parecem saídos de um programa policial de mal gosto, incoerentes com a elegância empregada no resto da narrativa. Mesmo assim, há ótimos momentos. Um dos mais representativos é quando vemos Bernie em uma festa durante o começo da crise de 2008: enquanto o mercado caía, ele fazia de tudo para que seu esquema não se dissolvesse. Ao fundo, tocava uma banda de jazz em um momento de improvisação. É como se estivéssemos vendo ele negociar como um solo de saxofone – sempre atento ao risco calculado, mesmo sob pressão. Chega a ser sublime ver a mulher dele (Michelle Pfeifer, incrível) assistir à apresentação da banda de maneira atônita, sem entender nada – exatamente como fez quando o escândalo veio à tona.

Chegamos ao mais importante: DeNiro acerta como não fazia em anos, controlando as nuances de seu Madoff diante do maior esquema de fraude financeira da história: certeiro, minimalista, metódico e acima de tudo, sensível. Vemos um homem frio, mas humanizado graças ao talento renascido de De Niro, que consegue como poucos atores expor sem maniqueísmo um homem calculista que, acima de tudo, era alguém que tinha certeza do que estava fazendo – assim como seu intérprete. E, claro, nunca sabemos quando ele fala a verdade. Pfeifer não fica atrás, apesar de ter poucas cenas. Aliás, ambos formam um grande time: é um filme de atores no qual muito se estabelece com sutis oscilações de voz. Também se destacam o silêncio e piscadas de Michele quando levam o marido preso e a feição gélida e quase apática de De Niro na mesma cena.

É importante ressaltar que tudo isso só é possível graças ao distanciamento calculado porém minucioso de Barry Levinson, que já havia trabalhado com DeNiro em Mera Coincidência. O diretor deixa que as performances aconteçam: mantém planos abertos e apenas se aproxima lentamente quando uma discussão se acalora. É por isso que os melhores momentos ocorrem nas cenas do casal, na cumplicidade de suas conversas e seus silêncios.

Por último, é importante dizer – sem spoilers – que o maior momento do filme ocorre no final, e é um mérito de DeNiro: o filme se resolve no olhar de seu grande intérprete. A história termina, mas uma dúvida persiste: um especulador pode ser considerado um psicopata quando a atrocidade de seus crimes lhe proporciona prazer ainda que cause mortes entre seus clientes? E como seus esquemas puderam ocorrer por tantos anos sem que nenhuma das instituições financeiras intervisse? Talvez as respostas sejam tão cínicas quanto o último olhar em cena.

Assista ao trailer de ‘O Mago das Mentiras’:

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