Felipe Curcio | 2 de novembro de 2016

cinemúsica: ESPECIAL WOODY ALLEN: Quando o clássico se torna óbvio?

(Este é o terceiro e último texto do Especial Woody Allen do CineMúsica) Toda vez que tenho que usar um traje especial para algum evento-festa-entrevista-qualquercoisainbetween, minha escolha sempre recai em alguma roupa preta. Já tenho até um vestido preto separado para essas ocasiões, e calças sérias para eu fazer cosplay de adulto. É um misto […]

(Este é o terceiro e último texto do Especial Woody Allen do CineMúsica)

Toda vez que tenho que usar um traje especial para algum evento-festa-entrevista-qualquercoisainbetween, minha escolha sempre recai em alguma roupa preta. Já tenho até um vestido preto separado para essas ocasiões, e calças sérias para eu fazer cosplay de adulto. É um misto de preguiça e certeza que me fazem optar pelo preto, afinal, não tem como errar usando essa cor, é uma cor segura e bonita.

De certa forma, Woody Allen tende a fazer isso. Não, não usar preto, mas optar pelo caminho mais seguro quando faz suas trilhas. Cheguei a elogiar o fato de Allen sempre optar por usar músicas que gosta em seus filmes – enquanto escreve também sobre assuntos que entende e tudo mais, só que há um lado perverso nesse costume: o risco de sempre ser a pessoa que usa preto em festas.

Com uma lista grande de filmes na sua carreira, Woody Allen poucas vezes ousou em suas trilhas. Chegou a repetir músicas em vários filmes, sempre na pegada do jazz e da ópera. Quando mudou um pouco, caiu para um clichê, falo, obviamente, de “Vicky, Cristina, Barcelona”.

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Feito em, duh, Barcelona, o filme conta com a musica da banda espanhola Giulia y los Tellarini, com o nome de … “Barcelona”. É a música principal do filme: bem ritmada e alegre, e, bem, é a cara da cidade, ou pelo menos, a cara da cidade idealizada pelo diretor, cheia de curvas, cores, sol alto e sempre alegre, o que, peço desculpas a todos que amam o diretor, é um puta de um clichê. Seria como tocar “Sampa” num filme sobre São Paulo.

Agora, volto a citar o uso anacrônico de George Gershwin em “Manhattan” (1979): a Nova York criada por Allen nesse filme já é clássica o bastante, o filme é feito em preto e branco, as cenas de descrição da cidade se sobrepõem as de diálogo dos personagens. Nessa película, Nova York é a verdadeira homenageada, na parte mais famosa do filme, Allen e Diane Keaton assistem o nascer do sol olhando a ponte do Brooklin, sentados num banco, Gerswhin ao fundo. Allen fala “não importa o que dizem, essa cidade é maravilhosa”, mas, quem, em sã consciência falaria algo dessa Nova York, naquele momento? E vou além na provocação: será que precisava de Gerswhin no fundo?

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Quando se coloca em perspectiva que o filme é de 79, e não dos anos 50, e que tratava de assuntos contemporâneos a 79 – e não era uma história de época, como Allen tem contado em seus últimos filmes – a trilha começa a parecer levemente pedante e extremamente óbvia. Afinal, é fácil achar Nova York bonita em preto e branco e ao som de Geshwin, é como achar o Rio de Janeiro bonito quando você está na praia de Ipanema num dia de céu azul. É fácil venerar Nova York nessa aura do jazz, mas será que a cidade, complexa e diversa, não merece algo diferente para exalta-la?

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Por mais que os sons de jazz funcionem como assinatura de Allen, será que, às vezes, não são uma escolha segura demais? Seria paixão ou apenas preguiça? Será que não está na hora de apresentar umas roupas coloridas pro Woody Allen?