Fernando Campos | 19 de agosto de 2016

Rebbeca: A Mulher Inesquecível

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2016/08/2837.jpg”] Celeste, primeira distribuidora cinematográfica cearense, tem por objetivo segmentar o público dos cinemas e trazer um tratamento diferenciado às obras. Tendo em mente que cada filme tem seu público e seu espaço, a distribuidora pensa em campanhas destinadas para cada produto, ao invés de só distribuir cópias pelas salas de cinema do país. […]

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Celeste, primeira distribuidora cinematográfica cearense, tem por objetivo segmentar o público dos cinemas e trazer um tratamento diferenciado às obras. Tendo em mente que cada filme tem seu público e seu espaço, a distribuidora pensa em campanhas destinadas para cada produto, ao invés de só distribuir cópias pelas salas de cinema do país.

O filme de estréia a ser exibido por Celeste é a versão remasterizada em 2K do primeiro filme americano de Alfred Hitchcock, Rebecca: A Mulher Inesquecível, adaptado do best seller homônimo de Daphne du Maurier. Por esta razão, vamos falar sobre ele na coluna desta semana. Vencedor do Oscar de Melhor Filme e Melhor Fotografia em 1941, Rebecca chegou aos cinemas brasileiros em 11 de agosto e acaba de ter mais uma semana acrescentada à programação: de 18 a 24 de agosto nas seguintes cidades: Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Fortaleza, Maceió, Palmas, Petrópolis, Recife, Salvador e São Paulo.

Apesar de ser conhecido como o “primeiro filme americano” de Hitchcock, o diretor nunca o considerou exatamente como tal. “Não posso dizer isso, pois é um filme britânico, totalmente britânico, a história é inglesa, os atores também, e o diretor, idem”, disse ele. “Há necessariamente uma grande influência americana nesse filme, primeiro por causa de (David O.) Selznick, depois por causa do autor de teatro Robert Sherwood, que escreveu o roteiro com um enfoque mais aberto do que teríamos na Inglaterra”. Resumindo: um filme essencialmente britânico produzido na terra do Tio Sam.

Contratado pelo produtor David O. Selznick, Hitchcock chegou a Hollywood em 1939 achando que dirigiria o filme sobre o Titanic, mas como Selznick havia conseguido os direitos de “Rebecca”, o foco mudou. Selznick tinha em mente que livros célebres deveriam ser fielmente adaptados, ao contrário de Hitchcock, que gostava de moldar o romance do seu jeito. O diretor teve de lidar (palavras do próprio) com um romance datado, fora de moda e sem nenhum humor, quando seu interesse de filmagem era, claramente, o suspense. A primeira metade do fime parece arrastada, mas já na segunda metade da projeção o filme ganha aquele magistral toque de suspense. Afinal, o “Selo Hitchcock de Qualidade” é inegável.

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Hitchcock tinha uma forma peculiar de trabalho: por ser grande fã do cinema mudo alemão, ele gostava de planejar visualmente seus filmes antes de começar a filmar, diferente de Selznick que, por questão de segurança, filmava os planos principais, a sequência do início ao fim e inserindo depois os personagens, além dos melhores takes e ângulos. Hitchcock não gostava de trabalhar dessa forma. Apesar das divergências e das ordens de Selznick, a produção não foi difícil, ainda mais levando em conta que Hitchcock terminou o filme a sua maneira porque Selznick estava atarefado demais com “E o Vento Levou”, clássico de 1939 vencedor de 8 Oscars.

“Rebecca” conta a história de uma jovem e frágil dama de companhia (Joan Fontaine) que se casa com Maxim De Winter (Laurence Olivier), um nobre inglês atormentado pela lembrança da primeira mulher, Rebecca, morta de maneira misteriosa. Na isolada mansão de Manderley, a recém casada não se sente a altura, não exala personalidade nem segurança, além de parecer incomodada com o título de sra De Winter. Em nenhum momento é chamada pelo nome, fator que, acredite, faz toda a diferença.

Ela tenta agradar a todo custo e acaba se deixando dominar e depois aterrorizar pela tétrica sra Danvers, que vive subjugada pela lembrança da inigualável-nunca-duplicada Rebecca, exercendo forte pressão psicológica sobre a nova senhora De Winter. A desumanização da governanta também é um fator digno de nota: a câmera em nenhum momento mostra a sra Danvers se locomovendo, seus pés não aparecem. Quando nossa heróina menos espera, ela está à espreita, aqui, ali, em todo lugar, como um espectro. E quando a verdade sobre Rebecca vem à tona, bem… é um soco bem no meio da cara.

Olivier, ressentido pelo fato de Vivien Leigh, sua futura esposa, ter perdido o papel da jovem frágil para Fontaine, tratou a atriz com desdém. Hitchcock se aproveitou desse clima e instruiu o resto do elenco a tratar mal a protagonista e assim obter o máximo de sua performance cênica: o semblante triste e perdido da nova senhora De Winter, assustada pelo fantasma da antiga senhora da casa.

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A Estalagem Maldita (Jamaica Inn, 1939), seu último filme inglês e antecessor de Rebecca, também baseado no romance homônimo de Daphne Du Maurier, não teve tanto êxito por assim dizer. Apesar de Hitchcock não ter vencido nenhum Oscar por Rebecca (o prêmio de Melhor Direção de 1941 foi pra John Ford, por As Vinhas da Ira), o filme foi melhor sucedido que o anterior: venceu Oscar de Melhor Filme, que foi para Selznick, e o Oscar de Melhor Fotografia, o belíssimo preto e branco de George Barnes que evoca com louvor a magia da mansão tenebrosa de Manderley. Manderley, que propositalmente não tinha localização geográfica alguma, encontrava-se isolada de tudo e de todos, justamente pro medo ser irremediável. Alguns anos mais tarde, em 1963, Hitchcock adaptaria outro trabalho de Daphne para as telonas, o atmosférico Os Pássaros (The Birds).

Mesmo depois de 76 anos, Rebecca, por muitas vezes considerado o “menos Hitchcock” de sua carreira, mostrou ao mundo a versatilidade do diretor, além de sua inegável habilidade, mesmo “fora de casa”. O único filme de sua carreira a ganhar o Oscar de Melhor Filme ainda teve outras oito indicações: Melhor Ator pra Laurence Olivier, Melhor Atriz pra Joan Fontaine – que por sinal viria a ganhar no próximo filme com Hitchcock, Suspeita, no ano seguinte – Melhor Atriz Coadjuvante para Judith Anderson, Melhor Direção de Arte, Melhor Roteiro, Melhores Efeitos Especiais, Melhor Trilha Sonora e Melhor Montagem.