Bruno Martuci | 19 de junho de 2016

Como Eu Era Antes De Você

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2016/06/maxresdefault-1.jpg”] Histórias de superação costumam cair no tão perigoso clichê. Um personagem, cujo sentido da vida já perdeu há muito, encontra uma centelha de esperança firmada no arquétipo do “salvador”, negando-a durante os dois primeiros atos da narrativa até perceber que estava fugindo de seu final feliz o tempo todo. Apesar de tal premissa […]

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2016/06/maxresdefault-1.jpg”]

Histórias de superação costumam cair no tão perigoso clichê. Um personagem, cujo sentido da vida já perdeu há muito, encontra uma centelha de esperança firmada no arquétipo do “salvador”, negando-a durante os dois primeiros atos da narrativa até perceber que estava fugindo de seu final feliz o tempo todo. Apesar de tal premissa ser a base para “Como Eu Era Antes de Você”, dirigido por Thea Sharrock e baseado no romance homônimo de Jojo Moyes, o filme traz uma reviravolta suficientemente satisfatória para aqueles que não suportam mais o melodrama água-com-açúcar das comédias românticas atuais.

Elencando uma trabalhadora classe média kitsch a um frio e sarcástico aristocrata tetraplégico cujo coração é mais impenetrável que as pedras que se erguem sobre sua modesta mansão, o longa começa com uma sequência aparentemente corrida, mas que nos traz à primeira virada da trama: William Traynor (Sam Claflin), um dos protagonistas, é atropelado de forma impiedosa por uma motocicleta. Dentre as múltiplas consequências às quais somos apresentadas, temos Will tetraplégico e encarcerado em um quarto adaptado, sua ex-noiva e seu melhor amigo prontos para contrair matrimônio e sua indiferença quanto às aulas de fisioterapia com Nathan (Steve Peacocke), mostrando como sua esperança de voltar à “normalidade” já se esvaiu há muito tempo.

Neste meio tempo, temos a linha narrativa de Louisa “Lou” Clark (Emilia Clarke), o arquétipo do coração bondoso e livre de preconceitos que acaba de ser demitida de seu emprego num restaurante devido a corte de pessoal. Além disso, seu relacionamento controverso com Patrick (Matthew Lewis) prova mais e mais vezes que o altruísmo é uma de suas qualidades inerentes: em uma sequência tragicômica, Lou finge estar feliz com a decisão do namorado em levá-la para a Noruega para competir com seus colegas atletas em vez de cumprir a promessa da viagem romântica.

Ambas as tramas se unem quando a garota acha uma vaga de emprego como cuidadora para Will. É interessante notar que, como a entrevista acontecerá na mansão dos Traynor, Lou abandona todo seu estilo brega – que vai de cardigãs rosa-choque e meias-calças com listras pretas e amarelas a presilhas coloridas e relógios de pulso de plástico – e se coloca num costumeiro, porém claramente desconfortável terninho: uma camisa branca de botões e uma saia de brim. Além disso, tenta afastar-se de seu linguajar mais interiorano para se mostrar à altura da família. Essas passagens rendem alguns momentos de descontração, mesmo que caiam no estereótipo da personagem deslocada e desastrada.

Após sua óbvia contratação, dá-se início à trama principal: em uma combinação inesperada de “Os Intocáveis” – com mais romance e menos química – a uma versão doméstica e abrandada de “Uma Linda Mulher”, Lou tem a missão de trazer Will de volta à vida, de mostrar-lhe as coisas que ainda existem e que nem tudo está perdido. De forma sutil e até que bem desenvolvida, principalmente pelo fato do roteiro ser escrito pela autora, a relação entre as duas personagens, a priori impossível, vai se fortalecendo com idas a museus, óperas, passeios a castelos e uma viagem inusitada para o Havaí. Na ilha, depois de momentos de puro prazer mundano, Lou percebe que seus esforços não foram o suficiente para fazê-lo mudar de ideia: ele decide pôr um fim a própria vida, pedindo para que a garota siga em frente e sempre se lembre dos momentos que passaram juntos.

Essas são questões profundas e complicadas nas quais o filme mergulha, mas infelizmente e com uma rapidez assustadora, são deixadas de lado. Apesar de seu jeito inelegante de dissertar sobre as políticas da eutanásia – com o lado contrário sendo representado por um personagem nunca identificado como religioso ou representado com um crucifixo -, “Como Eu Era Antes de Você” traz uma leitura admirável de uma pessoa inválida, que vai de encontro à sugestão implícita de que talvez a vida não valha tanto assim a pena. A delicadeza leviana com a qual tratou-se a realidade dos tetraplégicos não ajuda; até mesmo a adaptação do romance “A Culpa É Das Estrelas” (2014) foi bem além e trouxe detalhes mais verdadeiros sobre as dificuldades pelas quais essas pessoas passam, além de ser uma produção direcionada para adolescentes.

Claflin e Clarke são atores que não precisam de muito para mostrarem sua versatilidade artísticas. Entretanto, nenhum dos dois trazem performances realmente emocionantes. Clarke tem traços extremamente expressivos, mas muitas vezes ela oscila entre uma fofura agressivamente adorável e uma tristeza avassaladora, como se fosse uma representação humana de algo entre a boneca Kewpie e a estátua Pietà. O arco do personagem de Claflin é tanto quanto limitado, com sua atitude quanto à Lou variando de uma aversão condescendente a uma afeição mais condescendente ainda.

Assista ao trailer:

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