Felipe Curcio | 17 de março de 2015

cine música: Da Broadway para Hollywood – Parte I

[img src=”http://saladadecinema.com.br/wp-content/uploads/2015/03/lesmiz1.jpg”] Broadway sempre foi uma rua onde Hollywood gostou de andar. As produções que faziam sucesso nos teatros dessa região novaiorquina chamam a atenção dos produtores, diretores e roteiristas de Los Angeles até hoje. É lógico, as histórias dramáticas, as atuações, as coreografias e, principalmente, as músicas cantadas a plenos pulmões chamam a atenção […]

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Broadway sempre foi uma rua onde Hollywood gostou de andar. As produções que faziam sucesso nos teatros dessa região novaiorquina chamam a atenção dos produtores, diretores e roteiristas de Los Angeles até hoje. É lógico, as histórias dramáticas, as atuações, as coreografias e, principalmente, as músicas cantadas a plenos pulmões chamam a atenção da plateia, seja nos palcos ou nas telonas. Mas, não se enganem pelas plumas e paetês, transformar um musical em filme não é um trabalho fácil e muito menos uma fórmula mágica para ganhar milhões em bilheteria.

Por isso, pequenos padawans, resolvi fazer um outro especial. Dessa vez dedicado apenas àqueles filmes que foram baseados em peças gigantescas da Broadway. E, como não sou boba nem nada, falarei apenas daqueles que merecem a sua atenção. Serão quatro colunas e esta é a primeira. Se você curte musicais, vem comigo! Se odeia, melhor ainda!

Nessa primeira parte vou falar sobre um filme controverso, baseado em um musical conhecidíssimo, pelo menos nos Estados Unidos. E na França, risos. Falo, lógico, dos “Miseráveis” (Les Miz, para os íntimos). “Os Miseráveis” (2012) é um incrível caso de “café coado três vezes” que deu certo. Ok, deixe-me explicar. O filme é baseado em um musical que é baseado em um livro, o homônimo de Victor Hugo. Tinha tudo para ser bem… caído, mas não é. Na verdade, é bem o oposto.

“Os Miseráveis” conta a história de redenção de Jean Valjean (Hugh fuckin’ Jackman <3 ), um ex-ladrão que ainda é perseguido pelo inspetor Javert (Russell Crowe). Ok, a história é um pouco maior que isso, mas não quero me alongar, porque, antes de falar do filme, preciso comentar que “Les Miz” foi uma peça que ficou em cartaz na Broadway de 1987 a 2003, e voltou ainda em 2006, ficando até 2008. O que quero dizer com tudo isso? É que a pressão era grande quando Tom Hooper (aquele mesmo que ganhou Oscar de Melhor Filme por “O Discurso do Rei”) topou passar “Os Miseráveis” para o cinema.

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A primeira escolha de Hooper foi ousada: fazer o filme quase 100% cantado, até mesmo nas cenas onde só há diálogos, eles são musicados. Captar uma plateia de cinema, utilizando-se dessa linguagem, é um salto no escuro: as pessoas podem amar ou, simplesmente, não embarcar e achar terrível. Em “Os Miseráveis” o risco valeu a pena porque Hooper se valeu de outro “truque” muito bem colocado: “música ao vivo”.

Uma das maiores emoções de se ver um musical ao vivo no teatro é que os atores estão cantando de verdade. Cantando e atuando. Nenhuma canção é fora de lugar, todas pertencem a um contexto maior e, principalmente, há emoção no ato de cantar – e não há espectador que passe incólume a isso. Escutar a voz de alguém, ao vivo, é você escutar um pouco do seu sentimento; é ter um contato maior com essa pessoa, mais íntimo. Num filme, essa emoção da voz se perde um pouco. É lógico, nós sabemos que ele é gravado, logo, as vozes também estão lá, gravadas.

O que Hooper fez em “Os Miseráveis” foi ao mesmo tempo simples e, bem, complicado: ele gravou a voz da maioria dos atores (Amanda Seyfried, pelo que parece, não quis entrar nessa #risos) enquanto eles gravavam as cenas. E Hooper fez questão de gravar as músicas do começo ao fim, quantas vezes fosse possível, até que ficassem impecáveis (pobre do Eddie Redmayne, que teve que refazer uma cena musicada INTEIRA apenas 21 vezes). O que quer dizer que os atores, realmente, estavam cantando nas cenas e não apenas dublando. O resultado é claro no filme, emoção pura e simples.

Para exemplificar, coloco duas cenas. Uma, a clássica das clássicas: quando a prostituta Fantine (Anne Hathaway) canta a música-tema do filme, “I dreamed a dream”. Fantine está na merda, ela tem uma filha, mas não tem dinheiro para mantê-la; ela tenta fazer tudo o que pode, mas acaba perdendo aquilo que sobrava de sua curta dignidade. A dor da personagem é tanta, e Hathaway está tão dentro do papel, que há partes da música em que apenas escutamos os soluços de Fantine; em outras, a atriz balbucia as frases da canção, incapacitada de cantar. Não é uma música perfeitamente cantada e nem é para ser. Essas pequenas imperfeições trazem um poder impossível à cena, que é o poder da emoção.

A segunda cena é do meu maravilhoso Hugh Jackman (que ômi, meu deus, que ômi!). Recém-saído da prisão, Valjean está em dúvida, não sabe que caminho seguir, então canta uma de suas principais canções, “Who am I?”. A cena começa com frases musicadas e termina em uma música grandiosa. A voz de Jackman é forte, poderosa (digna de um ator que, de fato, atua na Broadway, como é o caso de Jackman); mas o interessante nessa cena, e que vai se repetir bastante ao longo do filme, é que Jackman atua enquanto canta. Ele não está ali, apenas cantando algumas palavras, seguindo uma coreografia, ele está atuando. E você percebe isso, você percebe que ele é Valjean. E essa aura verdadeira que nos faz seguir o filme até as maiores loucuras que pode te levar.

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Um dos grandes truques do cinema é fazer o espectador embarcar numa história que parece absurda. Te fazer gritar e ficar sem ar em certos pontos, mesmo que você saiba que é só ficção. E uma das maiores mágicas do musical é fazer com que você acredite, por alguns instantes, que a vida são apenas músicas e acordes musicais concatenados, com emoções e diálogos e cores e mais cores. Mas…peraí, a vida não é isso?