Ricardo F. Santos | 20 de março de 2014

Ninfomaníaca – Volume II | Crítica

Dada puramente por motivos mercadológicos, Ninfomaníaca foi dividido em duas partes para cobrir a extensa duração de 5 horas de material obtidos pelo cineasta Lars Von Trier. Já fica claro a continuidade direta com o Volume 1 desde o início, que começa imediatamente após o final deste. Nesta segunda metade, o dinamarquês mergulha ainda mais […]

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Dada puramente por motivos mercadológicos, Ninfomaníaca foi dividido em duas partes para cobrir a extensa duração de 5 horas de material obtidos pelo cineasta Lars Von Trier. Já fica claro a continuidade direta com o Volume 1 desde o início, que começa imediatamente após o final deste. Nesta segunda metade, o dinamarquês mergulha ainda mais em sua análise sobre a sexualidade, mantendo também a apurada inventividade visual.

A trama apresenta os três últimos capítulos da história de Joe (Charlotte Gainsbourg): A Igreja do Oriente e do Ocidente (O Pato Silencioso), O Espelho e A Arma.

De cara, o segundo volume já se diferencia tematicamente do anterior por apostar em situações mais absurdas. Se antes o caso amoroso de Joe e Jerôme (Shia LaBeouf) dominava a cena, aqui Trier traz personagens secundários assustadoramente interessantes. Temos lá um olhar denso sobre o sadomasoquismo na forma do misterioso K de Jamie Bell (papel que o ator faz muitíssimo bem ao retratá-lo quase como um psicopata, dando ênfase ao profissionalismo e à precisão cirúrgica de seu método) e uma bizarra “agência” liderada por Willem Dafoe. Esta última é certamente interessante, mas não faz o menor sentido dentro da proposta da narrativa (extorsão? Espionagem?), ainda que Trier tente trazer elementos como a literatura de Ian Fleming para sustentá-la. Por falar em não fazer sentido, é difícil de acreditar que Stacy Martin tenha se transformado em Charlotte Gainsbourg num espaço de míseros 3 anos…

Problemas à parte, o filme ganha o espectador novamente com suas profundas reflexões e a acertada dinâmica entre Joe e Seligman (Stellan Skarsgard, que aqui tem a chance de revelar novas facetas de seu não tão ingênuo personagem), sempre marcada pelas divertidas digressões do solitário solteirão – de alpinistas até o Paradoxo de Zeno. Além dos novos temas já mencionados acima, o roteiro de Trier surpreende por trazer a tentativa de Joe de sustentar uma família com Jerôme (onde quase, quase se repete uma cena-chave de Anticristo, e por circunstâncias idênticas) e um argumento muito interessante, e inevitavelmente polêmico, onde a protagonista analisa as hipocrisias da sociedade e os impulsos que movem um pedófilo – chegando a uma conclusão de alcance universal, ainda que seja um território bem delicado.

No geral, Ninfomaníaca é uma experiência eficiente – ainda que seu final seja um tanto contraditório – que funcionaria de forma mais impactante com uma sessão dupla de ambos os volumes. Do início ao fim, o fascinante estudo de personagem oferecido por Lars Von Trier convence e agrada pela inventividade temática e audiovisual (com exceção da fotografia de Iphone) de seu realizador.