Felipe Curcio | 26 de fevereiro de 2014

cine música: O som do século 21. E do 22

Amigos, eu escutei o futuro. E, para o meu total espanto, ele soava como o passado. Não, não estou falando de qualquer tipo de experiência maluca, mas da trilha sonora do mais novo filme de Spike Jonze, “Ela”. No filme, Theodore (lindamente atuado por Joaquin Phoenix) é um escritor solitário e, em certos pontos, romântico, […]

Amigos, eu escutei o futuro. E, para o meu total espanto, ele soava como o passado. Não, não estou falando de qualquer tipo de experiência maluca, mas da trilha sonora do mais novo filme de Spike Jonze, “Ela”. No filme, Theodore (lindamente atuado por Joaquin Phoenix) é um escritor solitário e, em certos pontos, romântico, que se apaixona pela voz do seu sistema operacional (interpretada por Scarlett Johansson).

Theo vive num mundo onde a tecnologia atrai tanto as pessoas que as hipnotiza no transporte público, uma tecnologia que começa a criar pensamento próprio. Qualquer semelhança com o seu dia a dia não é uma mera coincidência, mesmo. O mundo criado por Jonze é o futuro, mas as roupas são antigas e a trilha oscila entre o indie e o retrô.

Feita basicamente com acordes de piano, a trilha é limpa, sutil e muito bela. Nem bonita, bela. Porque o belo é mais harmonioso que o bonito. Nada de música eletrônica ou acordes grandiosos como os filmes do futuro estão acostumados a tocar para seus espectadores. Afinal, num mundo em que computadores têm voz e comportamento de pessoas, é comum que a música escutada não seja parecida com os sintetizadores à la Kraftwerk, mas aos acordes de piano e ukelele orquestrados pelo Arcade Fire.

Delicada, a trilha sonora do filme de Spike Jonze reflete não só o conteúdo de dentro da tela como também o jeitinho do diretor. Mais conhecido entre os cinéfilos por ser ‘o cara que dirigiu “Quero ser John Malkovich” e “Adaptação”’, Jonze, na verdade, criou o seu nome em outro meio, o musical. Sim, Spike Jonze foi um perito na direção e roteiro de videoclipes. Foi ele que botou os branquelos do Beastie Boys para perseguir criminosos ao estilo dos anos 70 no clipe “Sabotage”. Foi ele que uniu os nerds do Weezer a um episódio da finada sitcom “Happy Days”, dos anos 70, no clipe “Buddy Holly”. Foi também ele que fez a islandesa Björk dançar numa atmosfera dos anos 60 em “It’s Oh So Quiet”.

A ligação com o mundo da música trouxe a Jonze dois relacionamentos muito importantes para se entender a trilha de “Ela”. A primeira é com o Arcade Fire (parada para gritos histéricos da autora que ama esse pessoal!). A banda canadense, mais precisamente Will Butler, o “líder”, foi responsável pela trilha indicada ao Oscar por Melhor Trilha Sonora Original.

A outra relação é com a Karen O, vocalista do Yeah Yeah Yeahs. Junto do diretor, Karen O criou a lindíssima canção “The Moon Song”, também indicada ao Oscar de Melhor Música Original deste ano. No filme, ela é interpretada pela voz de Scarlett Johansson. Sim, o “computador” canta. E canta uma música que parece uma canção de amor antiga, acompanhada por ukelele daquelas possíveis de se escutar num filme em preto e branco de Audrey Hepburn.

A discussão sobre o papel da tecnologia na nossa vida num porvir nada distante é constante no filme (apesar de que o principal do filme é o fato de ele ser uma película sobre relacionamentos). Muitos se arrepiam de pensar num futuro “controlado” por máquinas. Bem, o que posso dizer a vocês é: se no futuro toca Arcade Fire, é para lá que eu vou.