Cassia Alves | 5 de novembro de 2012

cine sexo: Sexo de verdade?

Outro dia, Nicole Kidman abandonou a produção do novo filme de Lars Von Trier. As circunstâncias são convidativas ao olhar da coluna. “The nymphomaniac”, nas próprias palavras de Von Trier, é um pornô artístico. O polêmico dinamarquês já adiantou que montará duas versões de seu filme. Uma mais hardcore, novamente nas palavras do cineasta, para […]

The paperboy

Outro dia, Nicole Kidman abandonou a produção do novo filme de Lars Von Trier. As circunstâncias são convidativas ao olhar da coluna. “The nymphomaniac”, nas próprias palavras de Von Trier, é um pornô artístico. O polêmico dinamarquês já adiantou que montará duas versões de seu filme. Uma mais hardcore, novamente nas palavras do cineasta, para exibições em festivais, e outra mais suave para exibição comercial. O projeto é aguardado com certa ansiedade, também, porque Von Trier propala aos quatro ventos que seu filme, que acompanhará a vida de uma mulher ninfomaníaca (papel que será de Charlotte Gainsbourg), terá cenas de sexo reais – não que a ideia já não tivesse suficientemente clara quando ele disse que rodaria um pornô. Mas o reforço, no que parece, se faz necessário.

Nicole Kidman, que já havia trabalhado com o diretor em Dogville (2003) – filme em que sua personagem é sodomizada – abandonou o projeto depois que soube que teria que fazer sexo de verdade nas filmagens. Não é possível indicar com correção se Kidman não teria levado a sério as afirmações de Von Trier (pouca gente leva) ou se realmente ignorava as intensões do cineasta quanto ao filme. Certo é que o caso deflagrou questionamentos tanto sobre o filme – mais interessante do que nunca – as opções de Kidman – que já se expôs sexualmente em outras circunstâncias e também sobre a forma como o sexo pode e deve ser “representado” no cinema.

Nicole Kidman revelou sua nudez sem pudores em “Revelações” (2003), filme adaptado por Robert Benton da pungente obra de Philip Roth, sobre o racismo submerso em nossas menores escolhas. Antes disso, porém, ela havia rodado o thriller erótico “De olhos bem fechados” (1999) com seu então marido Tom Cruise, sob as ordens do genial Stanley Kubrik. O filme que seria eternizado como o último do cineasta, flagrava um casal em crise conjugal e exigia de Nicole e Tom um desprendimento e exibicionismo muito próximos de uma penetração de fato. A própria Nicole recentemente admitiu que muito do material gravado acabou no chão da sala de edição.

Em 2012, por exemplo, ela está em “The paperboy”, de Lee Daniels, em que faz uma periguete que tem tara por prisioneiros. Em uma cena muito comentada, ela urina no personagem de Zac Efron.

A saída de Nicole Kidman de “The nymphomaniac” relegou os demais atores ao rótulo de “eles topam fazer sexo real em um set de filmagens”. É um rótulo pernicioso e que não traduz exatamente os limites, agradáveis ou não, da busca pela representação fidedigna do universo retratado. Christian Bale, por exemplo, comeu insetos de verdade nas filmagens de “O sobrevivente” (2006), de Werner Herzog.

A forma como o cinema lida com o sexo pode render pautas diversas. Halle Berry e Billy Bob Thorton, por exemplo, fizeram sexo de verdade em “A última ceia” (2001), filme pelo qual ela levou o Oscar. Michael Fassbender, que não fez sexo de verdade, mas exibiu seu pênis sem estar teso em “Shame” (2011) se viu fora da disputa pelo Oscar de melhor ator, mesmo com apelos de crítica e público.

A discussão é intensa e, a despeito dela, as razões para que Lars Von Trier queira rodar um filme com (muito) sexo de verdade seguem desconhecidas. Provavelmente não excedem o fetiche, já que Von Trier talvez seja o cineasta mais fetichista e autoindulgente do planeta.